segunda-feira, 7 de maio de 2012

FINALMENTE: VIVA A RENATA

SABEDORIA

Precisava falar do Dalto, devo palavras à sua memória: quaisquer palavras. Não se trata de desabafo, mas da sensação de que depois de amanha, aos costumes, ele tocará a campainha, entrará pelo corredor do lado do jardim, irá direto às panelas ver o que se comerá e depois sim, dirá alô. Será sábado,quase todo sábado, de uns dez anos para cá foi assim.
Mas talvez não fale dele. Participamos da missa de sétimo dia, agorinha, em intenção de sua alma. Missa linda, emocionante., missa de chorar como nos ocorreu em maioria. Ele mereceu as nossas lagrimas.
E Deus falou-nos por ele, na primeira leitura - Sb 3, 1-6,9 “ A vida dos justos está nas mãos de Deus, e nenhum tormento os atingirá. Aos olhos dos insensatos parecem ter morrido; sua saída do mundo foi considerada uma desgraça, e sua partida do meio de nós, uma destruição; mas eles estão em paz. Aos olhos dos homens parecem ter sido castigados, mas sua esperança é cheia de imortalidade; tendo sofrido leves correções, serão cumulados de grandes bens, porque Deus os pôs à prova e os achou dignos de si. Provou-os como se prova o ouro no fogo e aceitou-os como ofertas de holocausto; no dia do seu julgamento hão de brilhar, correndo como centelhas no meio da palha; e o Senhor reinará sobre eles para sempre. Os que nele confiam compreenderão a verdade, e os que perseveram no amor ficarão junto dele, porque a graça e a misericórdia são para seus eleitos”.
Mas a Renata, sua filha ainda adolescente, falou-nos seriamente antes, ainda enquanto seu corpo era velado. Corajosa, sofrida, justa e morta de amor pelo pai, a esplêndida criança tomou da palavra ante os soluções engolidos, foi à tribuna do Parlamento Estadual e em presença de tios, avó, irmãos, mãe, pastores, padre, amigos, amigas, vereadores, deputados estaduais e federais que pranteavam o deputado morto, prefeitos, governador, e disse ao povo pelas ondas da radio legislativa: “ Meu pai tinha muitos defeitos, meu pai tinha muitas qualidades, meu pai cometeu muitos erros. Estou aqui para pedir desculpas por ele., ele era um ótimo pai”.
Viva a Renata! Salve a Renata. Ainda bem que nos ficou a Renata. E porque?
Talvez ela não raciocine como eu. Ou talvez ela saiba da vida muito mais que eu. Certo é que Renata se antecipou a mim, necessitado que me sentia de falar do meu amigo Dalto. Necessitado sim, vez que devo palavras, quaisquer palavras ao do Dr. Dalto Martins, médico cirurgião; ao Deputado Dalto Martins; ao Tenente Dalto Martins, ao Biólogo Dalto Martins, ao Sr. Dalto Martins.
Antecipou-se a Renata, pois queria ter-lhe dito singelamente das lutas que todos empreendemos para viver: religião porque precisamos crer, pois há um tempo desconhecido à nossa frente; sociedade, o homem precisa criar para construir a boa cidade; natureza, precisa-se viver.
E tem os obstáculos nesse nosso viver terreno: superstição quando não se tem fé para crer; preconceito, cercados que estamos por leis e mais leis; Elemental, visto que tudo em nossa vida são “coisas”.
Falávamos disso, Renata, seu pai eu. A grande questão que nos antepunha era, a meu ver o pior defeito que ele tinha: ausência de medo.
Gozado, precisamos ter medo para descansarmos dos nossos desesperos, precisamos de viajar pela vida, por difícil que seja, mas impõe-se que tenhamos o itinerário (é nossa construção, não o destino). Nossa impotência, Renata, precisa de nos levar à oração. Tem que nos socorrer o medo, nos ajoelharmos diante da ansiedade exagerada.
E Renata, permita-me dizer-lhe o que sempre disse ao seu pai: ter tudo nos faz lamentar tudo. Mas o Dalto não tinha medo. É por respeito à sua memóriaque digo: não tinha medo, era um defeito.
Prova disso é que só nos permitia ver nele o que a contraluz transparece. Como? Ele ouvia sem dizer nada, dizia sem ouvir nada. Mas, diga-se como marca desse sujeito espetacular, na maioria das vezes mal interpretado: era um pensador, um viajante em idéias.
De tanto voar sobre nós transformou nuvens em aventuras.
Aqui em casa terá na parede mais nobre a fotografia dele e do Bonfim, com a inscrição: "Neste ambiente estão faltando eles e a saudade deles está doendo em nós”.
Consola-me (sem trocadilho) e tomara que a você também, que as nuvens mudam de forma. Mirando bem e demoradamente o céu poderemos revê-lo quando quisermos. E mais, Renata, fixei-me em você porque demonstrou-nos lá na Tribuna da Assembléia Legislativa que representa muitíssimo bem a sua família. E até seu pai.     
    Escrito por nosso amigo Cesar Bernardo em seu blog: Finalmente

Um comentário:

  1. Lindas palavras que refletem alguém que o povo amapaense não conheceu, nunca estaremos preparados para a perda, e a dor nos acompanha por longos anos, mas o respeito por sua família que já era grande torna-se mais firma. Deus cuide de vocês.

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